6º Assombro (ou de como regressas para ver melhor quem sou. E apesar disso, talvez me salves)
Meto a chave na fechadura
(ainda estou do lado de fora),
a porta abre-se e dou as costas ao átrio enquanto faço a chave regressar à fechadura
(ainda estou do lado de dentro).
A porta fecha-se com algum vagar. Já não tenho pressa. Volto-me para o átrio e encontro-te meio escondido por uma parede. Um olho apenas. Encontro-te regressado para
(me)
veres melhor. Surpreende-me que tenhas refeito alguns passos do teu caminho
(só)
para te certificares que fui eu quem abriu e fechou a porta. Mas nem assim te sorrio. Finjo
(como sempre)
que não te vejo. E desta vez fingir é possível porque tens uma perna atrás da outra e um olho a espreitar
(inclinado)
atrás da parede que fica ao fundo do átrio onde
(fingindo)
permaneço hesitante. Segurando as chaves na mão, dando as costas à porta
(fechada).
Hesito entre ficar aqui dentro ou voltar para fora. Lá fora há um sol amarelo, um caminho demasiado estreito, vidros no chão e uma janela que alguém partiu
(as chaves perdem-se)
e levanto os olhos para a parede onde estavas, regressado e deixo de fingir que não te vejo
(não te vejo)
porque deixaste de me surpreender e continuaste a caminhar
(dou as costas à porta).
Não sei porque caminhas se é como se pertencesses, uma perna adiante da outra, um olho inclinado, àquela parede
(uma janela partida),
à minha surpresa pelo teu regresso para ver melhor quem sou
(eu sou quem?),
apesar de eu fingir que não te vejo, sempre que te vejo, regressar
(uma parede).
Já me vou habituando. Mas tenho saudades de ser uma rapariga
(imaginária)
de longos cabelos, à varanda e de tu não precisares de paredes e de olhares que se inclinam diante daquilo que finjo. Saudades de ser uma rapariga
(vidros pelo chão)
a quem anda não foi necessário salvar. Das chaves
(tenho saudades)
que me deram para meter nas fechaduras destas portas que parece que se abrem e se fecham
(mas não)
para além de nós. Das chaves que me entregaram para abrir vidas, corpos e cabeças
(sem regresso)
e que eu fui perdendo uma a uma, com a persistência cega
(salva-me)
de quem não pode
(perder)
nada. Meto a chave na porta
(ainda estou do lado de dentro)
e a porta abre-se
(resistindo)
como quem me expulsa. E surpreende-me que regresses do lugar
(uma parede)
para onde há pouco caminhaste. Uma perna adiante da outra. Os dois olhos nas minhas costas. E um ruído metálico de qualquer coisa que balanças entre os dedos
(os vidros no chão).
Não te vejo. A porta fecha-se
(ainda estou do lado de fora).
Meto a chave na fechadura e abrem-se os teus olhos
(uma janela partida)
e fingir que não sei que regressaste é impossível. Metes a chave na fechadura e a porta abre-se
(ainda estás do lado de dentro).
Já não finjo. Já não fujo. Sou outra vez a rapariga imaginária, à varanda. E há um ruido metálico
(um espanta-espíritos)
que te acompanha
(ainda estás do lado de fora).
Estendes-me os olhos e eu vejo nas tuas mãos
(salva-me)
as chaves que fui perdendo uma a uma, com a cega persistência de quem queria
(ser uma rapariga)
abrir cabeças e corpos, esperar regressos e não perder
(nada).
E eu vejo nas tuas mãos
(imaginárias)
as chaves
(estamos do lado de fora)
que, apesar de teres regressado
(uma janela partida)
para ver melhor quem sou, talvez me salvem.
(ainda estou do lado de fora),
a porta abre-se e dou as costas ao átrio enquanto faço a chave regressar à fechadura
(ainda estou do lado de dentro).
A porta fecha-se com algum vagar. Já não tenho pressa. Volto-me para o átrio e encontro-te meio escondido por uma parede. Um olho apenas. Encontro-te regressado para
(me)
veres melhor. Surpreende-me que tenhas refeito alguns passos do teu caminho
(só)
para te certificares que fui eu quem abriu e fechou a porta. Mas nem assim te sorrio. Finjo
(como sempre)
que não te vejo. E desta vez fingir é possível porque tens uma perna atrás da outra e um olho a espreitar
(inclinado)
atrás da parede que fica ao fundo do átrio onde
(fingindo)
permaneço hesitante. Segurando as chaves na mão, dando as costas à porta
(fechada).
Hesito entre ficar aqui dentro ou voltar para fora. Lá fora há um sol amarelo, um caminho demasiado estreito, vidros no chão e uma janela que alguém partiu
(as chaves perdem-se)
e levanto os olhos para a parede onde estavas, regressado e deixo de fingir que não te vejo
(não te vejo)
porque deixaste de me surpreender e continuaste a caminhar
(dou as costas à porta).
Não sei porque caminhas se é como se pertencesses, uma perna adiante da outra, um olho inclinado, àquela parede
(uma janela partida),
à minha surpresa pelo teu regresso para ver melhor quem sou
(eu sou quem?),
apesar de eu fingir que não te vejo, sempre que te vejo, regressar
(uma parede).
Já me vou habituando. Mas tenho saudades de ser uma rapariga
(imaginária)
de longos cabelos, à varanda e de tu não precisares de paredes e de olhares que se inclinam diante daquilo que finjo. Saudades de ser uma rapariga
(vidros pelo chão)
a quem anda não foi necessário salvar. Das chaves
(tenho saudades)
que me deram para meter nas fechaduras destas portas que parece que se abrem e se fecham
(mas não)
para além de nós. Das chaves que me entregaram para abrir vidas, corpos e cabeças
(sem regresso)
e que eu fui perdendo uma a uma, com a persistência cega
(salva-me)
de quem não pode
(perder)
nada. Meto a chave na porta
(ainda estou do lado de dentro)
e a porta abre-se
(resistindo)
como quem me expulsa. E surpreende-me que regresses do lugar
(uma parede)
para onde há pouco caminhaste. Uma perna adiante da outra. Os dois olhos nas minhas costas. E um ruído metálico de qualquer coisa que balanças entre os dedos
(os vidros no chão).
Não te vejo. A porta fecha-se
(ainda estou do lado de fora).
Meto a chave na fechadura e abrem-se os teus olhos
(uma janela partida)
e fingir que não sei que regressaste é impossível. Metes a chave na fechadura e a porta abre-se
(ainda estás do lado de dentro).
Já não finjo. Já não fujo. Sou outra vez a rapariga imaginária, à varanda. E há um ruido metálico
(um espanta-espíritos)
que te acompanha
(ainda estás do lado de fora).
Estendes-me os olhos e eu vejo nas tuas mãos
(salva-me)
as chaves que fui perdendo uma a uma, com a cega persistência de quem queria
(ser uma rapariga)
abrir cabeças e corpos, esperar regressos e não perder
(nada).
E eu vejo nas tuas mãos
(imaginárias)
as chaves
(estamos do lado de fora)
que, apesar de teres regressado
(uma janela partida)
para ver melhor quem sou, talvez me salvem.