5º Regresso (ou onde apareço, de repente, sem nada para te dizer)
Às vezes não penso
(em ti),
asseguro-te. É a verdade. Os dias vão escorrendo e eu não penso. Em ti. E depois, de repente, dou-me conta que já não existes
(já não te penso),
para mim. Que se te encontrasse não teria nada para te dizer, nem sequer
(boa tarde)
o que antes parecia urgente dizer-te
(como o amor).
Muitas vezes já não penso
(não existes)
em ti. E surpreende-me como as coisas se transformam e não damos conta onde foi que perdemos
(o que perdemos?)
as chaves que nos abriam um ao outro. Surpreende-me que não te pense, que não me existas. Que, de repente tenha perdido o que antes era tão urgente e necessário
(tu).
Às vezes reapareces-me. Como uma vaga memória de alguma coisa que me aconteceu
(o que me aconteceu?)
e eu não sei dizer já quando. Ou porquê. Ou como foi. Nessas vezes em que me apareces, procuro o que me deste e o que te dei e
(asseguro-te)
não encontro nada. Nada para me dizer de ti. Nada que te quisesse dizer
(e surpreendo-me),
nem sequer saber como te vai a vida. Não tenho nada para dizer -te e isso
(é triste, como um girassol queimado)
assegura-me que nada aconteceu
(afinal),
que não existes. Que nunca exististe
(nem eu),
e que fui eu que te inventei. E agora vais-te desvanecendo como tudo o que se inventa de repente, sem anotar os gestos, as palavras, sem tirar os retratos onde a invenção se parecia com a verdade, às vezes
(casas comigo?)
não penso
(em ti)
Deixaste de existir
(me)
como deixam de existir as coisas que não sabemos para que servem
(para que serviste?),
as coisas que não têm outra utilidade senão serem perdidas
(como as chaves que nos abrem uns aos outros),
esquecidas. Esquecidas mesmo, como se de repente aparecessemos e procurassemos lembrar-nos
(como era quando existias?)
o que é que foi que escrevi? Que ideia tive? Que imaginei?
Se não te penso é porque
(asseguro)
não foste de verdade. Se não te penso é porque nunca houve nada para te dar ou nada que me houvesses dado. Não tenho nada para
(te)
dizer mesmo se te encontrar, porque não estou capaz de reconhecer nenhum dos teus traços ou palavras. E nenhuma pergunta
(como te vai a vida?)
me reencontrará com a invenção de ti. Perdi as chaves que te abriam e me abriam e faziam com que entrassemos um no outro. De repente
(as portas fecham-se com estrondo e nenhuma janela se abre)
penso-te para pensar que já não penso
(em ti)
no que inventei. De repente só eu apareço como se fosse de verdade, sem nada para te dizer, nem sequer
(porque é que também me inventaste se nunca existimos?)
boa tarde.
4 Comments:
«Deixaste de existir, como deixam de existir as coisas que não sabemos para que servem
as coisas que não têm outra utilidade senão serem perdidas
(como as chaves que nos abrem uns aos outros)»...
É verdade que assim acontece,
Parabéns pelo texto.
Não sei se é verdade sempre, mas por vezes acontece.
Obrigada Blah :-)
Desculpa, não sei dizer nada. Só ler, só ler. Isto tudo é tão puro!
Alexandre :-)
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