Friday, August 04, 2006

7º Regresso (ou as chaves. Outra vez as chaves. E eu aqui. Outra vez. Atirando pétalas ao silêncio)

Os dias são feitos de silêncio. Podia dizer

(da tua ausência)

solidão ou flor. Mas é de silêncio que são feitos

(os dias)

os meus dedos, que embora procurem escrever-te como eras

(ontem)

quando não era necessário escrever, estão fechados. Não como quando as tuas palavras

(as chaves)

abriam flores. E geravam promessas, adiando a solidão. Agora a música alonga o silêncio e os dedos prolongam a ausencia

(para onde foste?)

das tuas mãos

(pequenas)

que alimentavam os meus cabelos. Os dias

(agora)

estão carregados de silêncios que se parecem com as chaves

(perdidas)

que abandonamos à entrada

(das casas)

dos corpos, à procura das palavras. As portas abrem-se e pousamos as chaves dentro das casas. Como quem abandona uma existência exterior e entra

(dentro)

em si mesmo. As portas fecham-se e pegamos nas chaves inertes. Como quem procura ter um corpo

(fora)

diferente onde escrever as palavras que os dedos contêm. As chaves estão pousadas ao lado do telefone

(silêncio)

e seria fácil pegar-lhe

(ontem)

para encontrar a porta fechada

(agora).

Procuro no fundo vazio da caixa do correio as pétalas daquela flor que gosto, mas de que me esqueço de pronunciar a cor

(promessas)

com a persistência dos loucos, rodando as chaves

(outra vez)

para expulsar o silêncio

(a solidão)

do corpo que trago

(de fora)

dentro. Aperto o botão do elevador. As chaves na mão

(tristemente)

penduradas dos meus dedos, como palavras escorrendo do cansaço. A porta abre-se e as promessas do átrio

(vazio)

atingem o coração das flores atiradas contra a porta da casa

(pesadamente)

fechada, que se abre depois para anunciar descansos. Podia dizer da tua ausência. Mas apanho as pétalas

(amarelas)

do tapete e pouso

(outra vez)

as chaves ao lado do silêncio.

13 Comments:

Blogger Maria Carvalhosa said...

Que dizer mais, Elisa?

Continuo a gostar. Muito.

Bjo.

6/8/06 4:24 PM  
Blogger Elisa said...

Obrigada Maria. Ainda bem.
Um beijo

6/8/06 8:17 PM  
Blogger Passionária said...

Gostei da descrição da ausência. Não é estranho como são as ausências, e não as presenças, que mais nos preenchem? Como seres humanos imperfeitos que somos só nos definimos no negro...

8/8/06 3:53 AM  
Blogger José Alexandre Ramos said...

"...das tuas mãos pequenas que alimentavam o meu cabelo".

!!!

um dia vou escrever algo tendo esta frase como mote. Tens noção do que dizes só aqui neste bocadinho? Mãos - cabelo - pequenas - alimentavam. Dá para escrever um conto, só isto!

Vamos a escrever mais, estás quase quase no poema.

Beijo fresco.

8/8/06 1:50 PM  
Blogger Elisa said...

Ou no branco, passionaria? Das presenças há pouco a dizer. Ninguém tem saudades ou sente a falta do que está aqui,
acho eu... mas do que já foi. Ainda bem que gostaste, seja a negro, seja a branco.

8/8/06 5:00 PM  
Blogger Elisa said...

Alexandre
e o calor? Para escrever, quero dizer... dou-me pessimamente com o calor... :-(
Um poema? Mas eu não quero escrever poemas...
Beijos

8/8/06 5:01 PM  
Blogger filipelamas said...

Atirar pedras ao silêncio? Ou pétalas? Parabéns pelo blog!

9/8/06 4:41 AM  
Blogger José Alexandre Ramos said...

"poemas" tipo "poemas mesmo" (risos), não era o que eu queria dizer. É que a tua escrita é lírica, poética, estás quase no poema. E aqui diz-se sempre muito, por mais curtas sejam as frases e as palavras. Não é como narrar, simples narrar. Entendeste?

Quanto ao calor... compreendo-te. Por isso mais beijos frescos.

9/8/06 6:49 AM  
Blogger Elisa said...

Olá Filipe
Obrigada. Pétalas. São 'armas' mais poderosas que pedras :-)

9/8/06 6:46 PM  
Blogger Elisa said...

Alexandre
ahhh bom! Fico mais tranquila. Já sabes o que fiz aos poemas que tive a veleidade de escrever aos 15 anos...
Obrigada pelos beijos frescos. Hoje fiz como tu me disseste outro dia. Enchi a banheira, meti-me lá dentro a ler. Foi uma bela viagem dentro de um livro e da água.
Beijo

9/8/06 6:48 PM  
Blogger Paulo said...

As chaves....ok!!! Sempre as chaves....

17/8/06 6:26 PM  
Blogger Elisa said...

Paulo
sim, as chaves... sempre as chaves...

1/9/06 5:52 PM  
Blogger Elisa said...

Meg
Obrigada eu... pelas palavras bonitas.
O coração não se gasta, não. Só parece que se gasta.

1/9/06 5:56 PM  

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